SEMÂNTICA
A sinonímia e o contexto: os quase-sinônimos
Comparem-se os seguintes pares de palavras (ILARI; GERALDI, 1990):
· seco / enxuto
· calvo / careca
· beber / tomar
· oftalmologista / médico de vista
Uma roupa seca é o mesmo que uma roupa enxuta, mas e quanto a uma senhora “seca” e uma “enxuta”? Do mesmo modo, “calvo” será usado em um tratado de dermatologia, mas não “careca”. Podemos beber e tomar o vinho, o leite e a água, mas o que dizer da sopa e do sorvete? Da mesma forma, uma pessoa de pouca instrução não vai falar “oftalmologista”, mas “médico de vista”, o que mostra que o uso também é responsável pela especificidade de sentido conferida às palavras.
As palavras que julgamos sinônimas sempre se especializam de algum modo, seja pelo contexto, seja pelo uso (ILARI; GERALDI, 1990); e por esse motivo mesmo, devemos ter cuidado, pois não podemos substituir aleatoriamente uma palavra pela outra sem correr o risco de prejudicar o sentido daquilo que, efetivamente, queremos expressar.
Assim, concluímos que o termo mais apropriado para designar os “sinônimos” é “quase-sinônimos”, já que não existem sinônimos perfeitos.
A sinonímia em Ullmann
Embora não negue a possibilidade de uma sinonímia completa (nas nomenclaturas técnicas, por exemplo), Ullmann (1964, p. 294-295) afirma-nos que não há sinônimos perfeitos e faz referência a um esquema proposto, em nove itens, por W. E. Collinson para explicar as diferenças mais comuns entre sinônimos, que reproduziremos aqui, em parte e com adaptações, sendo que o faremos com exemplos extraídos da língua portuguesa:
1. Um termo é mais geral que outro.
· desempenhar / executar
· função / tarefa
· ter / possuir
2. Um termo é mais intenso que outro.
· rejeitar / recusar
· assassinar / matar
3. Um termo é mais emotivo que outro.
· câncer / doença ruim
Um exemplo curioso divulgado na Internet, em um desses manuais destinados à defesa pessoal das mulheres: diante de um estupro iminente, aconselha-se que a vítima, em lugar de gritar por “socorro!”, grite “fogo!”, pois dificilmente será socorrida se gritar por “socorro!”, já que as pessoas temem a violência desenfreada que se estabeleceu nas grandes metrópoles; já a palavra “fogo!” não despertaria o medo da violência e as chances de socorro seriam maiores. Curiosamente, duas palavras bem diferentes (mesmo que estejam no mesmo campo associativo) acabam por se tornar sinônimas.
4. Um termo pode implicar aprovação ou censura moral enquanto o outro é “neutro”.
· capitalismo selvagem / livre empresa
· leproso / hanseniano
5. Um termo é mais profissional que outro.
· cefaléia / dor de cabeça
· cloreto de sódio / sal de cozinha
6. Um termo é mais coloquial que outro.
· bagaço / cansado
· rosto / cara / semblante
· casa / lar
· pôr / botar
7. Um termo é mais local ou dialetal que outro.
· Rio = biscoito / sinal
· São Paulo = bolacha / farol
· Rio = aipim
· Recife = macaxeira
Sinonímia e persuasão
A comunicação propriamente dita está mediada pelo signo e "o modo de articulá-lo, organizá-lo, poderá determinar as direções que o discurso irá tomar, inclusive de seu maior ou menor grau de persuasão" (CITELLI, 1986, p. 26).
Segundo Citelli (1986):
· As palavras nascem “neutras” (em "estado de dicionário").
· Vivemos mediados pelas palavras.
· A palavra ao se contextualizar passa a expressar valores e idéias; transita ideologias, cumprindo amplo espectro de funções persuasivas.
· A troca dos nomes: o eufemismo, cuja função é assegurar a recontextualização de um signo; com isto, ele expressará novas idéias e valores. (Lembremo-nos de que uma das preocupações do discurso persuasivo é provocar no receptor reações emocionais.)